segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Timor e o mar

Hoje o dia amanheceu coberto de sol.

Domingo de sol preguiçoso em Díli, com ameaça de chuva à tarde. Dia de sentir o mar e lembrar, mais uma vez, o quanto esta terra é linda debaixo de água.

Timor já foi parte do mar, terra submersa até que a dança dos continentes a trouxe para a superfície. É difícil de imaginar que as altas montanhas foram um dia domínio de peixes e algas, vendo-as hoje majestosas sobre o mar, embora elas próprias sejam as cicatrizes que a ilha traz do seu turbulento nascimento e passado. Parte de uma região que nos lembra constantemente do quanto a Terra é activa, os sismos são frequentes cá. Este é o ‘Anel de Fogo’ do Pacífico.

Dois mares envolvem a ilha, Pacífico e Índico, Tasi-feto e Tasi-mane. Dois mundos diferentes, Norte e Sul, a encontrarem-se na mais bela de todas as praias: a areia branquíssima e inabitada de Jaco, no extremo leste, onde a água misturada dos dois oceanos é fria e transparente.

Ilhéu Jaco, na ponta leste da ilha. Areia mais branca não há...

O mar em Timor, ao Norte e ao Sul, é casa de tartarugas, baleias, golfinhos e dugongos (sim, até dos raros dugongos). Um mundo encantado como apenas os mares do Sul o podem ser: águas cálidas e transparentes, cheias de vida em recifes de coral. Crocodilos marinhos vivem nos manguezais, reverenciados pelos Timoroan como ‘avós’. Fósseis vivos e um milagre da natureza em sua resistência à alta salinidade e capacidade de sobrevivência, já cá viviam antes de Timor ter se transformado em terra.
Mar que trouxe para cá alguns dos primeiros habitantes da ilha: nas escarpas rochosas de Lautein, pinturas rupestres mostram barcos e símbolos. Ainda hoje, bravos pescadores saem ao mar em pequenas canoas de madeira. Os flutuadores laterais lembram as canoas havaianas, embora as wa’ha sejam maiores e adaptadas ao mar aberto, como parte da cultura marítima a que pertencem, e os beiros sejam usados apenas para bordejar as praias. A afinidade pelo mar é um sentimento quase perdido, vivo apenas em Ataúro e nalgumas pequenas vilas, onde persiste a ligação com o ‘mobilis in mobile’.

Foto de Seppo Ihalainen recolhida aqui

Nadar no mar desta ilha é como entrar num jardim de esplêndida beleza. Timor é reconhecido como um dos melhores pontos de mergulho do mundo. Há pouca actividade humana no mar, e os recifes ainda sobrevivem, mesmo perto de Díli. Nas primeiras vezes, esquece-se momentaneamente de respirar, diante da surpresa do que está ao alcance dos olhos. O mar cria um feitiço constante: há algo de mágico em caminhar pela estrada na maré alta, olhar para o azul turquesa da água, a areia branca, os raios do sol ao entardecer a refletirem-se nas ondas, ouvir o som do seu movimento contra as pedras e o ruído distante da arrebentação contra o recife, ser borrifada pelo spray de uma onda mais alta. Entrar na água e descobri-la quente e agradável, e, ao abrir os olhos, descobrir um mundo tão diferente da terra, que, geração após geração, fascina aqueles humanos que, filhos da terra firme, ainda assim desejariam serem crianças de um mar sem fim.

Nota: veja aqui o Timor debaixo de água. E aqui também.

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